Eu nunca fui de me meter nos assuntos alheios, mas algo naquele lugar me chamou a atenção. Uma casa distante, no fim da rua, sempre tão silenciosa, como se estivesse sempre uma entidade lá dentro, um lugar esquecido. Ou talvez fosse o fato de que ninguém mais falava sobre o homem que morava lá, o tal que trancava os pássaros. O cara que, todo mundo sabia, não tinha muito apreço pela vida. Mas um dia ele sumiu. Ninguém questionou o sumiço. Todos estavam acostumados à sua solidão, ao seu silêncio. Até que, de repente, algo de estranho começou a a aparecer na minha cabeça, sobre esse homem.
Eu decidi ir até lá.
A porta estava entreaberta, como se esperasse por mim. Entrei sem fazer barulho, com a sensação de estar invadindo algo que já não era mais pertencente a ninguém. A casa estava escura, e o cheiro era pesado, abafado. As gaiolas vazias estavam espalhadas por todo canto. Eu sabia que ele as deixava ali, dia após dia, sem nunca se importar de verdade com o que estava dentro delas.
Foi então que vi ele.
Ele estava na sala, mas não como eu imaginava. Ele não estava mais caminhando, nem se movendo com aquela postura arrogante de quem controla tudo ao redor. Ele estava preso, trancado. Uma gaiola pequena demais para o seu corpo. Ele mal conseguia se mexer, com as pernas e os braços esmagados pelas barras de ferro. O rosto pálido, os olhos perdidos em algo que só ele sabia.
Fiquei ali, na sombra da porta, apenas observando.
"Você... você não pode me deixar aqui." A voz dele era fraca, quebrada. Ele estava suado, com os cabelos sujos. Não parecia o homem que eu tinha conhecido. Não parecia o homem que trancava os pássaros.
Eu não sabia o que dizer, então só fiquei observando enquanto ele tentava se mover, tentando encontrar algum tipo de conforto naquilo que não tinha. Ele se mexeu, mas as barras o impediam.
"Por favor... só me tire daqui," ele implorou, sua voz mais fraca agora.
Uma figura apareceu atrás dele. Era uma mulher, mas não uma mulher qualquer. Ela se aproximou com uma calma quase perturbadora. Não havia raiva no olhar dela, apenas uma quietude que me fez sentir como se estivesse em um pesadelo.
Ela não disse nada de imediato. Apenas observou, e o silêncio entre eles parecia mais pesado do que qualquer palavra poderia ser. O homem, agora aprisionado, começou a chorar, mas ela não se moveu. Ela se agachou ao lado dele e, com uma calma assustadora, falou:
"Você acha que eles pedem por isso? Que os pássaros pedem para ser trancados? Você sempre teve as chaves, não é? Sempre foi você quem trancou os outros, sem pensar nas consequências."
Ele não respondeu. Ele apenas balançou a cabeça, como se tentasse se convencer de que aquilo não estava acontecendo.
"Mas agora," ela continuou, com um sorriso que não chegava aos olhos, "agora você sabe como é ser o pássaro."
Eu vi o homem tremendo, suando frio, seu corpo se contorcendo dentro da gaiola. Ele tentou se levantar, mas as barras apertavam mais, e ele mal conseguia respirar. Ele tentou falar, mas a voz dele estava distante, quase inaudível.
"Eu... eu não fiz nada de errado... Eu só... só cuidei deles... Eles eram só pássaros..." Ele parecia desesperado, como se ainda tentasse justificar o que tinha feito. Mas as palavras saíam desconexas, sem sentido.
A mulher olhou para ele com uma expressão que não conseguia decifrar, e então, calmamente, ela colocou um prato de comida na frente da gaiola. Não era muito, apenas alguns grãos, o suficiente para manter alguém vivo, mas não para alimentá-lo. Ele olhou para o prato, mas não tocou. Seu corpo estava exausto demais para fazer qualquer movimento.
"Você vai comer?" ela perguntou, com uma leve ironia na voz. "Ou vai esperar que eu lhe dê mais alguma coisa?"
Ele não respondeu. Apenas permaneceu ali, com o olhar vazio.
Eu sabia que algo estava errado. Algo estava profundamente errado. Mas não conseguia sair, não conseguia mover um músculo. Estava preso ali, assistindo àquela cena surreal, como se estivesse preso dentro de uma história que não podia terminar.
A mulher se afastou, sem olhar para trás. Ela sabia o que estava fazendo, sabia que ele nunca mais seria o mesmo. Ele, que antes tratava os pássaros como objetos, agora estava condenado a viver como um deles, preso, sem liberdade, sem dignidade. Ele estava em um lugar onde o medo era o único companheiro, e a solidão, o único conforto.
E, enquanto ela se afastava, me dei conta de que não havia mais nada a fazer. O homem que uma vez trancou os pássaros agora estava preso na mesma gaiola que ele mesmo construiu.
![Pássaro em gaiola não canta, lamente.-[C]
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[IC]Eu nunca fui de me meter nos assuntos alheios, mas algo naquele luga](https://image.staticox.com/?url=https%3A%2F%2Fpm1.aminoapps.vertvonline.info%2F9391%2F7887f3d705f3367803992b307e61946b4041dba6r1-408-750_hq.jpg)
Comments (2)
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Já mandei, mano drácula!