Undead

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A névoa úmida de Londres dos anos 80 era o cenário perfeito para a dualidade de Peter. Por trás da maquiagem gótica e da pose enigmática no palco, pulsava um coração que não batia, mas ansiava. Não era apenas o vocalista do Bauhaus, o arauto do gótico, mas um vampiro de séculos, cuja existência se dividia entre a euforia dos holofotes e a fome insaciável da noite.

No Hammersmith Palais, os feixes de luz cortavam a fumaça do palco, revelando a sua figura imponente. Sua voz, um barítono profundo e ressonante, envolvia a multidão, que se contorcia em êxtase sob a melodia hipnótica de "Bela Lugosi's Dead". O palco era seu domínio, o suor dos fãs, sua energia vital. Cada nota era uma transfusão, cada olhar reverente, um gole em sua alma. Ele era a personificação da decadência e da beleza, um deus pagão para as massas que dançavam. A batida pulsante da bateria e o baixo ecoavam em seu peito, um ritmo macabro que mascarava a batida de seu próprio coração morto. Ele se entregava à performance, um êxtase quase físico, que adiava a outra fome, a verdadeira.

Após o bis final, a euforia cedia lugar a uma exaustão que não era mortal. Nos bastidores, enquanto os roadies desmontavam os equipamentos, ele se distanciava. A persona de rock star gótico se desfazia lentamente, substituída pela necessidade primária. Seus olhos, antes ardentes com a paixão da música, agora brilhavam com um fulgor gelado, faminto.

Ele se misturava à massa que saía do show, anônimo na multidão. Soho, com suas luzes de neon e suas sombras sedutoras, era seu próximo palco. Ele não buscava a inocência, mas sim a vitalidade, a efervescência da juventude que pulsava nas veias da noite londrina. Um jovem, sozinho, cambaleando ligeiramente de um pub, se tornou seu foco. Não havia pressa, apenas a certeza fria de um predador. A névoa o envolvia como um manto, e Peter se moveu com a graça letal que poucos viam.

Num beco escuro, o encontro foi breve. Não houve gritos, apenas um silêncio assustador, interrompido pelo som abafado de uma vida que se esvaía. Peter bebeu com uma urgência primordial, o sangue quente e rico, um contraste gritante com o suor frio do palco. Era uma experiência visceral, quase orgânica, que o conectava à vida de uma forma que a música nunca poderia. A complexidade de sua existência era uma tortura: a arte, a busca por uma conexão humana através de melodias e versos, e a necessidade brutal de consumir a própria essência humana.

Com os lábios manchados de carmesim e uma nova força correndo por suas veias imóveis, Peter emergiu do beco. A névoa lambia as ruas, e o amanhecer se aproximava. A noite entregava seu último suspiro. Em algumas horas, o sol seria um inimigo, mas logo a noite voltaria, e com ela, a oportunidade de ser novamente o mestre de cerimônias do Bauhaus, ou o predador das sombras. A canção e o sangue, as duas facetas de sua complexa imortalidade, aguardavam o próximo ciclo.

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authorial text by Lex