Existe a necessidade de plantar.

Que ela talvez não mereça.

Mas eu, mereço plantar.

Mereço cravar as mãos na terra, ainda que fúnebre,

e lançar sementes com a fé de quem já viu deserto florescer.

Porque um dia, as aves — as do céu e as do peito —

e até os pequenos invertebrados,

levarão o pólen daquilo que nasce em mim

e semearão campos inteiros,

até que o mundo se torne tão colorido

quanto o amor deveria manter-se:

vivo, mesmo entre ruínas.

O amor, esse ridículo sentimento,

é feito para ser visto.

E quanto mais vulgar sua expressão,

mais envergonhado o homem se mostra —

mas pergunto com sinceridade:

quantas vezes viraste o rosto

diante do sublime?

Diante do intocável?

Diante de um amor imaculado

que insiste em não apodrecer?

É fácil reconhecer uma flor branca,

ainda mais se ela dança entre rosas vermelhas

que já trocaram o amor pelo desejo.

A tua flor é branca.

Mas não de paz ou pureza —

é de resistência.

É um epíteto secreto que só tu conheces,

como um nome antigo, selado por alguma deusa esquecida.

Hoje escrevo não como quem declara,

mas como quem lembra —

lembra a ti, maithe

que somos Sol e Lua,

juntos mesmo quando distantes.

Ave e embarcação,

com promessas silenciosas entre cada pouso e partida.

E quando anoitece,

sinto tuas asas fechando-se em meu peito

como um cobertor que conhece meu frio.

E quando amanhece,

é teu beijo leve que sopra vento nas minhas velas

e me deixa velejar novamente,

pertencendo aos detalhes do mundo,

mas amando só como nós sabemos amar:

com coragem, com beleza, com entrega.

Com flor branca.

Porém

Aqui está um novo jeito de ver, de alguém que, apesar de já saber que não daria certo, ainda assim se entregou. É uma semente lançada no luto do que não floresceu:

Que talvez ela nunca merecesse.

Mas eu…

eu ainda assim cavei.

Cravei as mãos numa terra fria, quase estéril,

e plantei como quem já viu um deserto mentir flores.

Fiz isso com a fé cansada dos tolos —

essa fé que insiste, mesmo depois de tantas mortes,

de tantos nãos,

de tantas ausências enfeitadas de silêncio.

E nada nasceu.

Nem as aves — nem as do céu, nem as do peito —

vieram.

Nenhum inseto, nenhum sopro.

Só um campo estéril,

pintado com o pó das minhas tentativas,

com o luto das sementes que nunca vingaram.

O amor…

Esse ridículo sentimento que nos torna patéticos.

Não nasceu em ti.

Não como nasceu em mim.

E quanto mais vulgar eu fui tentando mostrá-lo,

mais tu te fechaste,

como se o sublime fosse uma afronta,

como se meu toque fosse uma mancha.

Quantas vezes viraste o rosto,

não diante do sublime,

mas diante de mim?

De um amor que não te pediu nada,

só espaço pra florescer?

Tua flor é branca, sim.

Mas não é de resistência —

é de distância.

É a cor da negação.

É a cor do que nunca foi sujo porque nunca se permitiu viver.

Teu nome, esse nome antigo que tu escondes,

talvez seja só mais um eco de alguém que nunca quis ser tocado.

Hoje eu não escrevo por saudade.

Nem por esperança.

Escrevo por cansaço.

Escrevo porque tentei.

E mesmo sabendo — mesmo sabendo! — que não seríamos,

eu fui.

Fui Sol quando tu eras sombra.

Fui embarcação naufragando sem vento.

Fui asa partida esperando por um ninho que nunca se construiu.

E se ao amanhecer ainda há brisa,

ela já não sopra de ti.

Sopra do que eu sou,

mesmo partido.

Mesmo exausto.

Mesmo só.

Amar como eu amei…

É só mais uma forma bonita de morrer.

E sinceramente, morrerei todo dia.

Para reviver e viver de novo.

Nossa história.