A Fragilidade da Ambição.

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ㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤRés a lenda que, em tempos imemoriais, o mundo que conhecemos hoje era habitado por uma miríade de formas de vida, que coexistiam em perfeita harmonia, preservando o equilíbrio de todas as coisas. Entretanto, havia uma raça de criaturas vorazes, que desrespeitavam os limites da natureza, movidas por uma ganância insaciável e uma impiedade sem fim. Cegas por seus próprios instintos destrutivos, essas criaturas eram capazes de devastar tudo o que tocavam. Esses seres, tão poderosos quanto frágeis, denominavam-se humanidade. Em apenas alguns milhares de anos, a raça humana precipitou sua própria destruição e, quase como se fosse uma punição divina, seis meteoros atingiram o solo sobre o qual caminhavam; quando já não havia mais escapatória e nada restava para ser salvo além de si mesmos, os humanos, em um último esforço desesperado, dividiram seus corpos em carne, ossos e alma, na esperança de um dia renascerem das cinzas. E assim, o tempo encarregou-se de apagar qualquer vestígio de sua existência, iniciando a nossa história.

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ㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤA obra intitulada "Houseki no Kuni", cuja nomenclatura original pode ser escrita pelos ideogramas 宝石の国, integra uma impopular franquia japonesa de demografia seinen, tendo como escritora e ilustradora a mangaká Haruko Ichikawa, que deu início à publicação de seu trabalho em outubro de 2012, através da editora Kodansha USA, na revista Tarde Mensal. Hodiernamente, o mangá conta com 13 volumes compilados em tankōbon, reunindo os capítulos da série, que teve seu lançamento concluído em abril de 2024. Houseki no Kuni insere-se nos gêneros de ação, fantasia, drama, mistério, aventura e distopia, sendo, portanto, um mangá destinado aos que apreciam uma leitura complexa, em que as nuances interpretativas fascinam o público, enquanto uma intricada trama se desenrola entorno de Phosphophyllite, a protagonista. Antes de seu encerramento, a obra ou por dois hiatos. Em uma entrevista, Haruko Ichikawa revelou que estava em busca de novos atempos, o que levou às pausas na publicação. A autora retornou ao trabalho em fevereiro de 2024 para concluir a série. No entanto, anteriormente, entre os meses de outubro e dezembro de 2017, foi ao ar uma adaptação homônima do primeiro arco da obra em formato de animação japonesa, produzida pelo estúdio Orange CG. A direção ficou sob responsabilidade de Takahiko Kyōgoku, com licenciamento da Sentai Filmworks, contando com 12 episódios legendados em português, que estão disponíveis nas plataformas Goyabu e Amazon Prime.

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ㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤAlmejando obter o respeito dos seus familiares, após receber de seu mestre a missão de criar uma enciclopédia abrangente do mundo em que vivem, Phos embarca numa aventura repleta de desafios, visando desvendar os segredos mais intrigantes e "divertidos" da ilha. No entanto, ao seguir as orientações de Cinnabar, a quem prometeu auxiliar a encontrar um novo propósito na vida, a gema, tendo pouca sagacidade, se envolve em diversas situações críticas. Em paralelo a isso, Phos observa um gradual enfraquecimento em sua relação antes íntima com Daiya e Kongō, gerando uma sensação de isolamento, enquanto nos corredores do templo, pairam segredos que aumentam a incerteza. A cada nova experiência vivenciada, ela desenvolve sentimentos conflitantes, direcionados tanto a suas irmãs quanto ao mestre e supostos inimigos, os Lunaris. O tempo avança e as ambições de Phos tornam-se cada vez mais impensadas, egoístas e perigosas, resultando em consequências devastadoras. As perdas sofridas durante essa trajetória são lancinantes, marcando a protagonista, que luta para encontrar equilíbrio e significado em meio ao caos que se instala em seu coração.

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ㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤPhosphophyllite, ou Phos, como é conhecida pelos mais íntimos, é inicialmente apresentada como uma houseki curiosa, gentil e espirituosa, embora fosse também extremamente ingênua, acreditando piamente nas criaturas que encontrou ao longo do primeiro arco da narrativa. Sendo a mais nova entre as gemas, com apenas 300 anos, suas ações e decisões eram impulsionadas frequentemente por sua imaturidade e impetuosidade juvenil. Contudo, após a perda de uma figura inspiradora para ela, além de partes de seu próprio corpo, devido aos eventos traumáticos e alucinações posteriores, Phos sofreu drásticas mudanças em sua memória e personalidade, assumindo uma postura mais raivosa e implacável. Para mais, à medida que o enredo avança, Phos questiona a veracidade de sua existência e os mistérios que entornam a conexão entre o Mestre Kongō e os Lunaris, unindo-se a Cinnabar para descobrir a verdade.

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ㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤCinnabar é a mais distante e introspectiva entre suas irmãs, residindo em uma caverna e realizando suas patrulhas solitárias todas as noites. Esta condição é determinada pela presença de um nocivo veneno de mercúrio em seu corpo, que a transforma em uma das guerreiras mais poderosas, sendo capaz de contaminar o ambiente e os animais, e destruir as memórias armazenadas em cada fragmento das gemas. A situação de Cinnabar é paradoxal: sua força baseia-se na natureza venenosa que a permeia, mas a obriga a manter-se em reclusão para evitar danos irreparáveis àqueles que ama. Entretanto, mesmo que tente ser apática diante de sua própria condição, Cinnabar anseia por escapar da solidão que a acomete, levando-a a contemplar a própria destruição como uma forma de alcançar a paz.

ㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤAntarcticite é uma houseki cuja existência se distingue devido à sua natureza cíclica. Seu corpo se solidifica apenas durante os rigorosos invernos, transformando-a em uma presença tangível. Nas demais estações do ano, a gema assume uma forma líquida, embora, ao contrário do que alguns pressupõem, não se trate de água, mas de uma substância única à sua composição. Sua personalidade protetora contrasta com sua origem gélida, mas não lhe foi possível interagir com suas irmãs, pois estas entram em estado de hibernação justamente durante o período em que Antarcticite se materializa. Quando Phos desperta antes do previsto, elas partilham companhia. Neste ponto, Antarcticite assume o papel de mentora para a protagonista, que desenvolve uma profunda iração pela mais velha, encantada pelo modo como ela, apesar de sua fragilidade, se tornou uma exímia guerreira.

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ㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤDiamond, carinhosamente apelidada de Daiya por suas irmãs, é uma guerreira de elite, destacando-se como a mais gentil e amorosa de todas as gemas. A disposição para auxiliar os outros é uma de suas qualidades mais célebres, evidenciando-se quando foi a única a buscar uma maneira de reaver o corpo físico de Phos, que havia sido, supostamente, destruído. No entanto, a vida de Daiya não é facilitada por sua bondade e sensibilidade, pois ela enfrenta um intenso complexo de inferioridade inerente ao seu desempenho em combate. Ainda que seja um diamante puro, o que confere a ela o maior poder ofensivo entre as houseki, a ausência de substâncias "extras" em sua composição impede a distribuição uniforme de impactos em seu corpo, deixando-a suscetível a riscos durante as batalhas. Neste cenário, Daiya se compara frequentemente às suas companheiras da categoria diamante, Yellow e Bort.

ㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤBort, a guerreira mais poderosa e irada da ilha, é reconhecida e temida por sua rigidez inflexível e críticas incisivas, mas representa tudo aquilo que Phos aspira ser: perfeita. Como uma combatente experiente e calculista, Bort demonstra uma capacidade quase infalível de evitar erros em batalha. Todavia, a personagem está cativa em um conflito interno, decorrente da pressão de ser "aquela em quem todos podem confiar", um fardo autoimposto que impacta diretamente seu temperamento, fazendo dela irritadiça e muito exigente consigo mesma. Posteriormente, nos é esclarecida a turbulenta e dolorosa relação que Bort conserva com Diamond, sua "outra face da moeda". Elas se amam como verdadeiras irmãs, mas são confrontadas pela dura realidade de que há espaço apenas para uma guerreira no topo, e este cargo pertence ao diamante impuro.

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ㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤKongō, que aparenta ser um monge, é a figura paterna das houseki. Ele é o responsável por recolher estruturas minerais dotadas de vida e moldá-las, transformando-as fisicamente nas personagens que conhecemos. Ademais, o mestre assume o papel de educador, designando funções específicas para cada gema, mas sempre respeitando as limitações mineralógicas de cada uma. A trama o apresenta como um homem singularmente gentil, pacato, compreensivo e protetor. Todavia, sua existência desencadeia uma série de questões, como, por exemplo: qual é sua verdadeira relação com os Lunaris? Por que ele, possivelmente humano, está vivo por tanto tempo? De onde ele veio, há quanto tempo está na Terra e o que sabe sobre os assassinatos das joias? Assim sendo, Kongō é, sem dúvida, uma das figuras mais enigmáticas da obra.

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ㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤEntender a dedicação que os autores investem em seus trabalhos pode ser gratificante, especialmente ao considerar como eles pensam em cada detalhe. Logo, deixo abaixo algumas curiosidades sobre a obra:

ㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤTodas as houseki são assexuadas, ou seja, não possuem gênero masculino ou feminino, deixando a critério de quem acompanha decidir como se referir a elas;

ㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤA gema mais velha é a Yellow, com seus singelos 3.597 anos;

ㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤHouseki no Kuni ganhou o prêmio de Melhor CGI na Crunchyroll Awards 2017 e foi indicado nas categorias de Anime do Ano, Melhor Ação, Melhor Animação, Melhor Ending e Melhor Trilha Sonora;

ㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤA personalidade, aparência e características das gemas são inspiradas em pedras preciosas reais;

ㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤAs personagens são "imortais". Elas podem ser reconstituídas a qualquer momento, desde que as partes estejam disponíveis.

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ㅤㅤㅤㅤㅤㅤㅤHouseki no Kuni, embora seja uma produção inteiramente realizada em CGI, uma aposta indubitavelmente arriscada por parte do diretor, revela-se um anime de execução magistral, até revolucionária. Ao mencionar suas qualidades técnicas, destacam-se o cuidado evidente com os designs e a atenção meticulosa aos mínimos detalhes, tais como o manuseio da câmera, a fluidez dos movimentos e as excepcionais coreografias de luta. As expressões faciais, por sua vez, são de uma sutileza notável. Há um trailer em 2D criado para promover o material original, que, apesar de ser muito bonito, demonstra como optar pela animação em computação gráfica foi a melhor escolha possível, pois valoriza imensamente as particularidades das gemas e dos Lunaris. No que concerne ao roteiro, é possível afirmar que ele é impecável na transmissão de sua mensagem. Houseki no Kuni é uma obra melancólica e profunda, abordando temas como o existencialismo, a necessidade de corresponder às expectativas alheias, a ambição incessante de estar sempre acima e ser o melhor em tudo, a dependência emocional, a incapacidade de ouvir ao próximo e o conformismo com uma vida vazia, além da morte e o que a sucede. Phos, a princípio, é como uma criança, doce e pueril, mas conforme a trama avança e seu corpo, representando os ossos, entra em contato com a carne e a alma, observa-se a corrupção, a cisma e a perdição que a assolam, tornando-a pútrida, capaz de portar tanto o bem quanto o mal em seu coração, tal como a raça há muito extinguida. Houseki no Kuni proporciona reflexões intensas, apresentando uma perspectiva cruel, porém, realista das consequências de cada atitude tomada, sem mergulhar na previsibilidade. A jornada de Phos, em minha opinião, é extraordinariamente inesperada, pois nos lembra que o sentir, o saber e o poder em demasia conduzem todo ser à ruína.

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A𝗲sth by 𝗦a࣭ky on A&N

𝗖reׁdits:ㅤ𝗖apິaㅤּㅤ𐙚녓

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